Stefan Salej
Sem dúvida alguma, as nossas preocupações com a campanha eleitoral são legítimas. Dizem os especialistas que campanha é campanha, e governar é governar. E que na campanha o que importa é ganhar voto. E assim a nossa campanha nos leva ver a oitava economia do mundo, com previsão de vir a ser a quarta em vinte anos, limitada aos nossos enormes problemas, mas totalmente distante do que esta acontecendo no resto do planeta. Somos um país jabuticaba, fora do contexto mundial, para os candidatos à presidência. Será que nada do que acontece no mundo nos afeta e nada disso precisa ser discutido porque somos um povo de eleitores ignorantes, que não se interessam pelo que acontece lá fora? Não, mentira.
Somos um país integrado ao mundo, considerado importante, e o mundo no qual vivemos é importante para nós. E mais, o que acontece no mundo nos afeta muito mais do que se pensa ou quer aceitar.
A bonança do primeiro governo Lula deu-se em função de altos preços globais de matérias primas, que encheram os cofres do governo, que então podia se dar ao luxo de distribuir parte desses recursos. E o fracasso do segundo governo Lula e, consequentemente, dos governos Dilma, deu-se em parte devido à crise financeira internacional em 2008, que Lula chamou de “marolinha” e disse que o Brasil estava imune. Tão imune estava que a má administração do fenômeno tem consequências até hoje.
Comércio exterior, aumento de nossa competitividade e mudanças tecnológicas mal são mencionados nos discursos dos candidatos. A guerra comercial provocada pelo atual governo dos Estados Unidos, que nos afeta em grande escala, não existe. A abstração dos conflitos no Oriente Médio, deixando de lado as irresponsáveis declarações populistas de alguns candidatos evangélicos, só confirma o nosso papel de anão diplomático. A saída do Reino Unido da União Europeia e falta de um acordo do MERCOSUL com a União Europeia, que aumentaria os nossos negócios, não são considerados assuntos que poderiam afetar a nossa economia.
O único item na área externa é a Venezuela, que nos deve 50 bilhões de dólares, e que tratamos mais como um resíduo da política lulo-petista do que como uma questão de política externa do maior país da América Latina, que é o Brasil. E se não fosse a invasão dos imigrantes em Roraima, que para a população do Sul também não existe, nem essa questão seria debatida.
O câmbio só interessa discutir porque vai encarecer as viagens internacionais, a gasolina e as remessas de lucros, além do pagamento de nossas dívidas no exterior. Ninguém discute a política de comércio exterior, o fluxo do capital estrangeiro e nem a eventual crise financeira no mundo.
Bem, se os candidatos não discutem por alegar que o eleitorado não está interessado, ainda pode ser compreendido, apesar de não ser verdadeiro. Mas que os economistas dos candidatos prefiram evitar essa discussão, é preocupante.
Se vier uma nova crise financeira, se o conflito comercial entre os Estados Unidos e China se prolongar, se o terrorismo ganhar mais espaço e aumentar a insegurança no mundo, e se e se que não acaba mais, vamos dizer que Brasil é imune mais uma vez e que tudo não passa de “marolinha”?
A ilusão de que temos reservas cambiais para estarmos imunes às crises é inversamente proporcional à que está acontecendo no nosso vizinho Argentina, da qual também ninguém fala. Efeito vodca: amanhã eu serei você.
Oh! jabuticaba gostosa e enganosa.
STEFAN SALEJ, consultor empresarial, foi presidente do Sistema Fiemg e Sebrae MG