Flávio Roscoe
A atual legislação previdenciária brasileira é, na prática, o maior programa de concentração de renda do mundo, com uma característica absolutamente perversa: tira dos mais pobres e dá aos mais ricos; a aposentadoria dos pobres fica cada vez menor e a dos ricos cada vez maior.
O Brasil não tem opção: ou faz – agora e com urgência – a reforma da previdência ou entrará em situação de irreversível insolvência. Vale dizer: sem a reforma da previdência, o Estado quebra.
Estas são verdades sobre a previdência social que só agora a sociedade brasileira está entendendo e compreendendo. São verdades irrefutáveis na visão de dez entre dez especialistas e que também se destacam a partir da análise de estatísticas definitivamente inaceitáveis por criar no país brasileiros de primeira e de segunda classe.
De fato, são números chocantes, que explicitam privilégios que beneficiam o funcionalismo público e precisam acabar. Enquanto os aposentados da iniciativa privada, que recebem do INSS, têm aposentadoria média de R$ 1.404,67, no serviço público elas chegam a ser até 20 vezes maior. Funcionários aposentados do Executivo recebem aposentadoria média de R$ 7 mil; R$ 18 mil no Ministério Público; R$ 26,3 mil no Judiciário e R$ 28,5 mil no Legislativo.
Quando se considera o teto das aposentadorias, o cenário é igualmente injusto e inaceitável: menos de R$ 6 mil na iniciativa privada (INSS) e R$ 30 mil no serviço público.
Do ponto de vista social, portanto, o atual modelo previdenciário do país é injusto e desde sua criação, há muitas décadas, penaliza os mais carentes. Do ponto de vista econômico-financeiro, é uma tragédia de proporções alarmantes. O déficit atuarial – diferença entre as estimativas de pagamento de benefícios e as estimativas de arrecadação de contribuições ao longo do tempo – atinge, no âmbito da União, a duas vezes o Produto Interno Bruto (PIB) do país – ou seja, cerca de R$ 13 trilhões.
O cenário é igualmente grave em todos os estados do país e nos mais de 5.500 municípios. Em Minas Gerais, o déficit atuarial da previdência pública, que atende exclusivamente aos servidores públicos, é um dos piores do país e estudos de especialistas mostram que ele chega a 11 vezes o montante da receita corrente líquida anual do Estado.
Em termos anuais, no âmbito da União, o déficit foi de R$ 300 bilhões em 2018 – cerca de 5% do PIB. Em Minas Gerais, ele foi de, aproximadamente, R$ 18 bilhões, o que representa aproximadamente 3% do PIB estadual, que é da ordem de R$ 600 bilhões.
Fica claro, portanto a necessidade e a urgência de fazer a reforma da previdência no país e de, necessariamente, estendê-la aos estados e municípios, nos quais a situação chega a ser ainda mais grave. Afinal, estados e municípios não têm poder para a emissão de dívidas, o que só é permitido ao governo federal. O mais preocupante é que esta é uma realidade que só tende a se agravar, pois, se nada for feito agora, é inevitável que a distância entre receitas e despesas, já quilométrica hoje, se amplie no futuro.
Em razão de mudanças no perfil etário da população, o Brasil perde aceleradamente o chamado “bônus demográfico”, caracterizado por ter uma parcela maior de população jovem. Hoje, o número de aposentados cresce a um ritmo de 3,5% ao ano, enquanto a população em idade de trabalhar cresce a apenas 0,7% anuais. Ou seja: no final das três próximas décadas – em 2040 – teremos muito menos trabalhadores na ativa para pagar a aposentadoria dos inativos. Simplesmente não haverá dinheiro.
Assim, se a PEC (Proposta de Emenda Constitucional) enviada pelo governo ao Congresso Nacional, instituindo a “Nova Previdência”, não for aprovada, restaria, como única opção, aumentar os impostos federais, para cobrir o déficit anual de R$ 300 bilhões, e os impostos estaduais (ICMS), para cobrir o déficit de R$ 18 bilhões com a previdência dos servidores públicos mineiros. Para o país, isso representaria uma redução na taxa de crescimento da ordem de 3,6 pontos percentuais (p.p.) do PIB, o que levaria a economia imediatamente de volta à recessão. Em Minas, o aumento do ICMS para cobrir o déficit de R$ 18 bilhões implicaria numa redução de 1,6 ponto percentual do potencial de crescimento do estado, uma perspectiva dramática.
Estes são dados que reafirmam, de forma enfática e definitiva, a necessidade urgente de implantação da “Nova Previdência”. Aumentar impostos em um país com 13 milhões de desempregados e no qual a União, Estados e Municípios já ficam com quase 40% do PIB é absolutamente inadmissível. E também é inadmissível quebrar o país, levando-o à insolvência, para garantir privilégios de poucos em prejuízo da maioria dos 200 milhões de brasileiros.
Flávio Roscoe é presidente da Federação das Indústrias de Minas Gerais (Sistema FIEMG)
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