Stefan Salej
Anúncios iguais a esses que rodam os jornais nestes dias, dizendo que o acordo entre o Mercosul e a União Europeia será concluído nas próximas semanas ou meses, vimos tantos nos últimos 25 anos de negociação, que já perdemos o seu número. Hoje em dia se alguém, seja quem for, tentar adivinhar quando fecha esse acordo, recomenda-se-lhe que compre um bilhete de loteria, onde tem mais chances de acertar do que quanto ao fechamento do acordo.
Se não fechou nestes 25 anos é porque há muitas razões de parte a parte para não concluírem o acordo. E o mundo mudou muito nesse período, inclusive os países que compõem os dois blocos econômicos em questão.
A União Europeia passou de 15 para 28 países, a Grã-Bretanha estaria saindo do bloco (outra incerteza), consolidou sua moeda, o Euro e consolidou-se como uma economia forte, com divergências politicas oriundas da história do próprio continente. E avançou na área de tecnologia, assim como se tornou o mais importante investidor estrangeiro nos países do MERCOSUL.
O MERCOSUL teve seus avanços sim. Os quatro países que o compõem mantiveram seus sistemas democráticos funcionando e suas economias, tirando a Argentina, a exceção que confirma a regra, relativamente estáveis do ponto de vista financeiro. Mas, como bloco econômico, não se integraram mais e nem dentro do espirito de fundação. Efetivamente, as expectativas e esperanças de formação de um bloco econômico e quiçá político foram infinitamente inferiores às esperanças e até resultados dos primeiros anos.
O acordo entre os dois blocos tem todo sentido e seria uma mudança fundamental no desenvolvimento das economias dos países do MERCOSUL. Agora, não pode ser um acordo onde, como tudo indica, haverá um crescimento razoável de exportações europeias e um avanço muito pequeno de nossas exportações para a UE. Nenhum estudo recente aponta com clareza os números, inclusive na criação de empregos, nos países de MERCOSUL. Enquanto nós crescemos em competitividade do agronegócio, mas de forma alguma em produtos oriundos do agro mais sofisticados, como vinhos, embutidos, lácteos etc., a Europa cresceu em tecnologia, produtos industriais com alta tecnologia, serviços e produtos alimentares. Então as trocas serão, simplificando, de uma boiada por um quilo do presunto de Parma.
As negociações empacaram nas tarifas, algo atrasado na realidade do comércio internacional do futuro, nas trocas comerciais de baixa tecnologia e nos problemas regionais europeus que geram políticas de protecionismo de fazer inveja ao Trump. Não há visão de um projeto comum de desenvolvimento entre as duas regiões que poderia beneficiar as populações, com aumento de renda e emprego. E a Europa, sublime e gananciosa, se comporta como se nós não tivéssemos alternativas.
Quando começaram as negociações, a nossa parceria com China era nula. Hoje é o nosso parceiro principal, inclusive em capitais e tecnologias. Se fecharmos acordos com a Coréia do Sul, Japão, Canadá, Suíça, e com países do Pacífico, estaremos bem encaminhados para o nosso futuro, com uma relação até mais equilibrada do que com a UE.
E tem mais, fechar acordo é difícil, implementar ainda mais. E alguém está tendo plano de implementação? Até para aprovar os acordos já feitos, o Brasil leva anos na burocracia do executivo e do Congresso. Nesse meio tempo, arrumar a casa e fortalecer o próprio MERCOSUL seria muito útil para fechar um acordo, com seja quem for, e mais eficaz.
Stefan Salej
Ex Presidente do SEBRAE Minas e da FIEMG
Vice-Presidente do Conselho do Comercio Exterior da FIESP
Coordenador adjunto do GACINT Grupo de análise da conjuntura internacional da USP