Por João Batista de Freitas especial para o Exempplar On line
Existem muitas lendas a respeito da elaboração de músicas famosas, sejam nacionais ou estrangeiras. Vamos aqui, neste espaço, contar algumas das mais belas lendas que conheço, já informando que se trata apenas de lenda, não correspondendo à verdade de sua criação. Mas foi elaborada de forma tão simpática e romântica que acaba indo parar na Internet como se fosse verdade.
A primeira lenda é a respeito da música ‘As rosas não falam’, um belo samba-canção composto pelo carioca Angenor de Oliveira, o Cartola, que emplacou muitos sucessos além deste. Cartola teve uma infância muito pobre, estudou somente até o primário, e recebeu este apelido porque usava um chapéu-coco para se proteger do cimento quando era ajudante de pedreiro.Diz a lenda que morando na favela da Mangueira, no Rio de Janeiro, Cartola criou uma filha de seu primeiro relacionamento, que era prostituta em São Paulo. Depois que se casou com D. Zica, raramente ele falava com a enteada, mas Cartola esperava sua visita. Daí a justificativa para os versos: ‘Volto ao jardim, com a certeza que devo chorar, pois bem sei que não queres voltar para mim.’ E também ‘Devias vir, para ver os meus olhos tristonhos, e quem sabe sonhavas meu sonho, por fim.’ Este sonho seria o retorno da filha para casa.Mas um famoso crítico carioca, que conviveu com Cartola, desmente esta história e dá informações sobre a verdadeira história que também é bela. Conta-se que um dia Dona Zica, esposa de Cartola, ganhou um buquê de rosas do compositor Nuno Veloso. Resolveu plantá-las no jardim e algum tempo depois, ao olhar o jardim, ficou extasiada com a quantidade de rosas desabrochadas. Chamou então Cartola e perguntou por que havia nascido tantas rosas, ao que ele respondeu: – Não sei, Zica. As rosas não falam…
A frase ficou remoendo na cabeça do compositor. Conta a história que ele tomou do violão e a música brotou em poucos minutos. O mestre estava para completar 65 anos, e disse então que ‘As rosas não falam’ foi o seu presente de aniversário. Ainda sobre a canção, Paulinho da Viola contou que quando trabalhava na TV Cultura de São Paulo, no ano de 1973, apresentando um programa que buscava mostrar pessoas ligadas à música, principalmente sambistas ligados às escolas de samba, apresentou Cartola no programa. Durante a gravação, Cartola pediu para cantar uma de suas canções e pela primeira vez entoou ‘As rosas não falam’. Mas a gravação comercial desta pérola só aconteceu em 1976, na voz de Beth Carvalho.
Cartola é um caso especial em nossa música popular. Homem de origem e vida modestíssimas era, ao mesmo tempo, poeta, cantor e compositor sofisticado. Pena que somente nos últimos anos de vida tenha tido o reconhecimento da maior parte de sua obra.
A segunda lenda diz respeito à música El Reloj, belíssima composição do mexicano Roberto Cantoral, que fez muito sucesso no Brasil nos anos 1960. Conta a lenda que ele fez a música numa sala de espera de um hospital, aguardando as últimas horas de sua amada, desenganada em um leito daquele local, vítima de uma grave doença. Daí viria o pedido ao relógio da sala de espera que parasse de marcar as horas, porque ele não poderia viver sem seu grande amor. Bonito, não? Mas um dos biógrafos de Cantoral conta que na verdade a música foi composta em 1956, quando ele tinha apenas vinte e um anos, e estava em um hotel com uma jovem dançarina, após uma excursão aos EUA do Trio ‘Los Caballeros’, do qual o compositor participava.
Trata-se apenas de uma simples canção romântica, que Los Caballeros gravaram em 1957, e hoje possui mais de cem gravações em todo o mundo. Robert Cantoral também é o compositor da canção ‘La Barca’, mundialmente conhecida e gravada por inúmeros artistas. O compositor e cantor morreu em 2010, aos 75 anos, vítima de um enfarto.
A terceira e última lenda – talvez não seja realmente uma lenda. Pelo menos não encontrei nada que desmentisse a história da música He’s not heavy, he’s my brother, uma bonita balada escrita por Bobby Scott e Russell Bob. Esta canção se tornou um sucesso mundial depois de gravada por The Hollies no final de 1969 e novamente por Neil Diamond em 1970. Contam que o que inspirou essa canção aconteceu em uma noite de forte nevasca, na sede de um orfanato em Washington. Já era noite e alguém bateu à porta. O atendente deparou-se com um menino coberto de neve, com poucas roupas, trazendo em suas costas outro menino mais novo, aparentemente desmaiado de fome e frio. A cena comoveu o atendente que os deixou entrar, orientando ao primeiro garoto que colocasse o outro no sofá, dizendo: “Ele deve ser muito pesado”, ao que ele retrucou, dizendo: “Ele não pesa, ele é meu irmão (He ain’t heavy, he is my brother). Mas ele não eram irmãos de verdade. Eram apenas dois jovens que viviam nas ruas de Washington. Os compositores, quando ficaram sabendo da história, compuseram a bela música que até hoje é muito executada.
Belo trabalho, parabéns!
Parabéns !!!! pelo pesquisa maravilhosa!!!!
Às vezes a versão poética torna-se mais encantadora do que a realidade. Prefiro a poesia.
Eu prefiro a poesia muito mais do que a realidade.