
Cresci ouvindo minha mãe dizer que “o Natal é a festa da família; momento em que todos se encontram; época em que as pessoas se reúnem e festejam”. Fui crescendo e todo ano ouvia a mesma coisa. Às vezes, queria passar o Natal com amigos ou mesmo na casa de familiares, mas ela negava. Pós-Natal, sim! O Ano Novo estava liberado para eu viajar e entrar de cheio nas férias escolares, mas o Natal, não.
Por outro lado, meu pai não era muito de festejar o Natal. Quanto mais se aproximava a data, mais ele ficava angustiado, triste, melancólico. Parecia não gostar de todo aquele clima natalino. Raras vezes ceávamos em casa. Muitas vezes éramos convidados a cear na casa de meus tios. Nunca soube o porquê da reclusão de meu pai. Poucas pessoas poderiam me ajudar nas respostas. Como ele passou sua infância em seu país de origem, talvez esteja lá o que procuro.
Eu sei que ele viveu e passou alguns natais de sua infância durante o período da 2ª Guerra Mundial. Por outro lado, o povo italiano é alegre e festeiro; o Natal, por mais difícil e cruel que fosse a situação, era festejado e cantado pelos cidadãos de Paola, na Calábria, um povo religioso e festeiro. Daí minhas observações me levaram a pensar em algo particular, pessoal, intrínseco. Quem sabe, era a saudade da terra, dos amigos, da família, da festa local que fazia os seus olhos ficarem pequenos, distantes, reflexivos.
Lembro-me de que um dos meus irmãos e eu passamos alguns natais observando aquele comportamento fechado, triste, pensativo. Dormíamos, discutindo o seu silêncio e a sua postura apática diante dos preparativos. Ele nada proibia, apenas parecia ignorar o desenrolar da data.
O contrário acontecia na passagem do ano. Ele era outro homem. Festeiro, alegre, convidativo e cheio de entusiasmo. Comprava muitas coisas para a ceia de Ano Novo e para o almoço do dia seguinte. A casa ficava cheia de gente e de alegria e tudo parecia voltar ao normal. As dúvidas que eu tinha ficavam no ano que findava, junto com o Natal. Elas voltariam a me incomodar no próximo mês de dezembro, mas até lá tínhamos um ano todo pela frente. De qualquer maneira, nós nos reuníamos em família, como sempre foi o desejo de minha mãe.
Hoje, vejo meus filhos crescerem, a família aumentar e se dispersar e a vida em constante mudança. Minha mãe já não está mais entre nós. Sua ausência deixa um grande vazio a cada Natal. Quando ao meu pai, ainda guardo, na memória, o seu silêncio natalino.
Descubro que fico entre a tristeza e a alegria, a festa e a reclusão. Meu interior duela e percebo que somos construídos de velhos e novos tijolos da existência humana. Carregamos muito da vivência, da convivência e do aprendizado. Sem perceber, passamos a ter atitudes ou a viver situações percebidas em outros que pareciam ser tão diferentes às nossas. De repente, começamos a praticar e a partilhar as diferenças que, agora, nos tornam cada vez mais iguais.
Muitas mulheres sofrem da depressão pós-parto. Como o Natal é nascimento, por outro lado, pode ser que haja, para alguns, uma melancolia pré-natalina.
Antonio Trotta – Jornalista, escritor e poeta
@atrottamg













