PALAVRA DO PRESIDENTE DA FIEMG
Olavo Machado Junior
O consumidor brasileiro paga até hoje – e paga caro – pelos graves erros cometidos pelo governo federal com a Medida Provisória 579, convertida posteriormente na Lei 12.783/2013, à época anunciada como a grande solução para os problemas do setor elétrico brasileiro, incluindo a redução das tarifas cobradas de consumidores residenciais e industriais. Foi um sonho que durou muito pouco tempo.
Ao ignorar regras elementares do setor, romper contratos, propagar a insegurança jurídica e imaginar que poderia até mesmo revogar seculares leis de mercado, a iniciativa, prepotente e claramente populista, levou o setor ao caos, desvalorizando empresas consideradas ícones da boa gestão (inclusive estatais) e onerando pesadamente os consumidores, que ainda pagarão por longos anos os custos de empréstimos bilionários – que as companhias foram obrigadas a fazer para cobrir despesas – que eram mascarados e não repassados às tarifas.
Mudou o governo, mas infelizmente a lição não foi aprendida. Pouco mais de quatro anos atrás, o governo federal obrigou as empresas do setor a aceitarem a antecipação do vencimento de suas concessões, e sua renovação sob condições desfavoráveis, sob pena de perdê-las. Tratava-se, sem dúvida, de uma violência contra empresas resguardadas por contratos juridicamente perfeitos e em pleno vigor. Algumas delas reagiram, e a Cemig, modelo no Brasil e no mundo, foi uma delas: recusou-se a antecipar a renovação das hidrelétricas de Jaguara, São Simão e Miranda, cujos contratos só venceriam muito tempo depois: Jaguara, oito meses à frente, em agosto de 2013; São Simão, em janeiro de 2015, portanto dois anos depois; e Miranda, em dezembro de 2016, praticamente quatro anos depois. Além disso, os contratos das três usinas previam renovação automática e garantida por mais 20 anos.
Em vão, a Cemig tentou negociar. Foi à justiça, chegou ao Supremo Tribunal Federal (STF), conquistou liminares e seguiu operando as três usinas. O governo federal, por meio da Advocacia Geral da União (AGU), recorreu, recusando-se, mais uma vez, a negociar conforme proposta do tribunal. Recentemente, conseguiu, com argumentos descabidos, derrubar as liminares. Neste momento, enquanto a Companhia aguarda pelo julgamento do mérito da ação que impetrou, os consumidores temem as consequências de uma eventual retomada das três hidrelétricas pelo governo federal, que já anunciou licitações para setembro deste ano. O risco iminente é de mais aumento de custos para os consumidores.
Também é inaceitável o argumento para insistir na retomada das usinas: o governo alega que precisa licitá-las (vender suas concessões) para arrecadar recursos e reduzir o déficit público. Sabemos que não é missão do setor elétrico gerar receitas para resolver problemas decorrentes da má gestão das finanças públicas. É absurdo, portanto, o argumento apresentado. Ao setor elétrico compete gerar energia para sustentar o crescimento da economia brasileira, que passa hoje pela pior recessão de sua história.
Ademais, como o governo espera arrecadar cerca de R$ 12 bilhões com a nova licitação de Jaguara, Miranda e São Simão, forçosamente terá que redirecionar a energia gerada por elas do chamado “mercado livre”, no qual se abastecem os grandes consumidores, para o chamado “mercado cativo”, ou “mercado das distribuidoras”, voltado para o atendimento dos consumidores residenciais e pequenos empreendimentos do comércio e da indústria. Só forçando preços altos para as distribuidoras, poderá haver interessados dispostos a pagarem o bilionário valor pretendido pelo governo. Em qualquer dos mercados, mais uma vez, o consumidor pagará a conta.
Ao desviar a energia do “mercado livre”, a oferta se reduzirá e os preços desse mercado se elevarão naturalmente, onerando os grandes consumidores – empresas que produzem e geram milhões de empregos. Ao forçar a compra de energia pelo “mercado cativo”, as empresas distribuidoras, que já trabalham com excesso de energia em razão da recessão e consequente retração do consumo, ficarão com mais energia cara sobrando. Para cobrir os custos dessas sobras caras, terão, obrigatoriamente, que repassar essas despesas aos consumidores residenciais e pequenos comércios e indústrias, naturalmente via aumento de tarifas. Lamentável!
Esse cenário, absolutamente factível devido às suas consequências danosas, repudia a intransigência do governo federal em insistir na retomada das usinas, cujas concessões, do ponto de vista legal, pertencem à Cemig. Mostra, também, que tentar fazer do setor elétrico uma fonte de geração de recursos para cobrir o déficit público pode desestruturar ainda mais um segmento que é crucial no processo de retomada do crescimento da economia. O bom senso e o senso de justiça recomendam que caminhemos em direção oposta. Se contratos com empresas nacionais são desrespeitados pelas autoridades máximas do país, como esperar que investidores externos venham para o Brasil neste ambiente de extrema insegurança jurídica?
OLAVO MACHADO JUNIOR é presidente da FIEMG.